Anjos e Demônios


A ignorância é uma bênção!
É com essa frase de teor extremamente niilista, que na verdade, ironicamente, pertence ao Beatle John Lennon (consegue pensar em alguém menos niilista que Lennon? Só a Madre Teresa), que iniciamos o ano de 2014 para o espaço cult. A razão disso? Simples: é no mínimo curioso o fato, quando percebido, que os menos informados tem uma certa vantagem socio-interacional imediata sobre os que se esforçam para obter o mínimo de cultura. E qual seria esta vantagem? A tranquilidade em saber que é normal, comum, aceitável, boa praça, boa prosa... que fala o que os outros querem ouvir.
Não estou, com isso, afirmando que a sociedade em geral é ignorante... se bem que é!
Segundo Nelson Rodrigues “Toda unanimidade é burra”. Isso tem uma certa lógica. Apesar de parecer um posicionamento um tanto quanto preconceituoso, exprime com exatidão o sentimento de exclusão vivido pelo indivíduo que, percebendo estar deslocado em meio a um grupo que preza mais pelos valores estéticos e consumistas que ditam os padrões comportamentais na sociedade moderna do que pelo próprio crescimento intelectual/pessoal, volta-se para um casulo criado à partir de suas frustrações e dali, dificilmente se retira por conta própria. 
Esse indivíduo excluso, espólio de uma coletividade “perfeita”, de uma classe que se julga a espinha dorsal da humanidade, terá de manter-se à parte e a par dos movimentos sociais encabeçados por essa elite formada pelos resquícios da “geração coca-cola”. De fora, privilegiando-se com uma visão panorâmica e imparcial, esse sujeito será capaz de perceber o quão vazia é esta fatia da população. E o pior: ele percebe também que tudo e todos conspiram a favor da proliferação da ignorância coletiva.
Quantas vezes vemos na tv anúncios promocionais do último romance de Luiz Ruffato? Quantas das crianças que assistem aos desenhos animados que tratam comicamente da história do velho-oeste americano, seus cowboys e peles vermelhas, lerão, um dia, algum dos excelentes romances históricos de Dee Brown? Condicionado à ignorância e ao entretenimento de baixa qualidade, o cidadão não aprende. Se não aprende, não questiona. Se não questiona, continua em sua condição inicial de ignorância.
A oktoberfest e o carnaval possuem destaque em rádio e tv. E quanto às feiras de livros? Os seminários, congressos literários, as Comic-cons (a propósito, a primeira exposição internacional de quadrinhos se deu no Brasil no ano de 1951 em São Paulo. Alguém sabia disso?), os encontros anuais de estudantes universitários? Tais eventos se veem limitados a um certo nicho, uma parcela ínfima da comunidade. Obviamente, não há e nem haverá interesse externo (político) na promoção de tais acontecimentos. Afinal, a política do pão e circo é a mais viva herança romana em nossa sociedade. MORTE À SOCIEDADE JUDAICO CRISTÃ OCIDENTAL!!! (Cara, que saudade do Osama...).
Outro dia, estava eu sentado no sofá, entretendo-me com o conhecido jogo eletrônico “Dante’s Inferno”. Meu pai, um rústico senhor de cinquenta e quatro anos, semianalfabeto, ex-católico, recém convertido evangélico pentecostal, senta-se no sofá ao lado. Incialmente vislumbrado com a perfeição dos gráficos, ele fixa os olhos na tela. Sem demora, seu semblante maravilhado converte-se em espanto. Pouco depois, em horror. Chegando ao limite do que ele, enquanto um pai cristão pode admitir, olha para mim e diz: “Meu filho, isso não é coisa boa da gente ficar vendo não...”. A razão para tal medo? Simples: Ao descer aos nove círculos do inferno, Dante, protagonista do jogo, se depara com cenários grotescos (daí vem a expressão “dantesco”), legiões infindáveis de demônios e toda sorte de criaturas macabras. Sem mencionar a extrema violência mostrada no jogo. Como agora explicar ao meu pai, um rústico senhor de cinquenta e quatro anos (blá, blá, blá...) que a trama do jogo nada mais é que uma adaptação do clássico da literatura europeia “A Divina Comédia” de Dante Alighieri, escrita no início do século quatorze e consagrada como uma obra canônica? Tarefa difícil...

Os vinte e cinco minutos seguintes conduziram minha empreitada no intuito de “danteimizar” meu velho pai. No entanto, ele, enquanto homem de pouca escolaridade, possui o artifício da “falta de oportunidade” como justificativa à sua falta de informação. E os jovens que passam horas frente ao vídeo-game? Sabem da origem do jogo? Ao menos já leram a respeito da divina comédia? De fato, os jovens não são incentivados a buscar razões lógicas ou origens em suas atividades lúdicas. Apenas o entreter-se no momento já lhes é suficiente.
Não foi fácil explicar ao meu pai que, apesar do impacto visual das figuras abomináveis do jogo, os verdadeiros demônios o encontram todos os dias na rua, lhe cumprimentam educadamente e ainda o chamam de amigo. A sedução pela palavra e aparência são as verdadeiras marcas visíveis do inferno. Perguntei-lhe: “Caso quisesse atrair alguém, convencer esse alguém a segui-lo, como se apresentaria? Sob uma forma bela e alinhada, ou sob uma imagem já estereotipada como sendo a representação do mal?” Mensagem captada. Missão cumprida... ao menos em parte.
Cena do Jogo Dante's Inferno da produtora Visceral Games.
Tarefa ainda mais árdua seria tentar incutir no consciente de um indivíduo já estabelecido como ser pensante e independente, um pouco de conhecimento acerca de algo que não lhe desperte interesse. Vivemos tempos difíceis. E, nesses tempos de Ipod’s, um livro, um mero “gibi” que seja, tem seu espaço tomado pelos gadgets do momento. Não julgo a diversão pela interação virtual como vilã, apenas uma ferramenta mal administrada. Como já dito, não há incentivo à cultura. O adolescente que pende ao interesse pelo cult, muitas vezes o faz por conta própria, muitas vezes por influência de outros intitulados “NERDS”.
O fato é que o jovem que opta por ampliar seus horizontes e localizar-se em meio a um espaço interacional mais culto, terá uma visão de mundo mais complexa e intimidadora, enquanto que o indivíduo alienado e despojado de obrigações intelectuais ou morais, perceberá um mundo mais fácil e cooperativo. Sem conhecimentos, não há responsabilidades. É... são tempos difíceis! Quando a realidade se impõe como uma evidência não há forma de a contornar”. Palavras de Aníbal Cavaco Silva, presidente de Portugal.
Enfim, para evitar mais delongas neste que deveria ser apenas um texto introdutório para o novo ciclo do blog, deixo aqui uma pergunta para reflexão: será mesmo o homem produto do meio, como sugere Marx(istas)? Ou teríamos a habilidade de determinar os rumos do meio no qual nos inserimos, tornando-o, este sim, um produto de nossas ações planejadas. Bom, uma coisa eu afirmo: O sujeito que se permite moldar pelo ambiente, e não o contrário, jamais gozará da verdadeira noção de livre arbítrio. Jamais terá em sua vontade a capacidade de ser o fator determinante em sua própria existência. Este sim, há de conhecer (sem reconhecer) seus demônios.

“Tudo aquilo que te vier à mão para fazer, faze-o por tua própria força.”

 – Eclesiastes 9:10A.

O início... de novo.


Ipiaú-BA, 18 de fevereiro de 2014


Oi? Como, caro leitor? Não, não, não... isto não é uma carta. Não exatamente. Não. Também não perdi (ainda) a sanidade. Apenas gostaria de marcar a data da “ressurreição” (Aaaaaleluia!!!) do canal outside.

Devido a uma série de contratempos, entre compromissos profissionais e rotinas universitárias, nosso blog passou por um considerável período de hibernação. Nossas postagens foram interrompidas para que outras atividades pudessem ser encaminhadas e concretizadas.

O lado bom disso é: todo animal que hiberna, está, na verdade poupando energia no inverno, guardando suas reservas acumuladas para retornar à ativa na primavera seguinte. Pois então, a primavera acaba de chegar por aqui. Prepare-se, amigo leitor, toda a energia poupada será descarreagada agora no seu juízo!

Nossa... isso pareceu um tanto violento, né?
Tá. Desconsidere essa última parte.

Keep calm and... DON'T PANIC!!!

Estamos de volta! E vem coisa boa por aí...