Assim se imprime na narrativa a marca
do narrador, como a mão do oleiro na argila do vaso. (BENJAMIN, Walter. O
narrador: considerações sobre a obra de Kikolai Leskov. In: Magia e técnica, arte e
política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 7ª Ed. São Paulo:
Brasiliense, 1994. p. 2005)
Pensemos,
inicialmente, num processo de criação literária. O que leva a criação de uma
produção literária? Quais os fatores imbricados dentro deste processo? Eis
questões que poderíamos ficar anos e mais anos refletindo e obtendo milhares e
milhares de respostas. Para sermos mais preciso, pensemos na relação entre o
produtor de uma obra literária e seu produto. Haverá alguma relação
existencial, ou melhor, corporal entre autor e obra?
Por muito
tempo, venho partilhando do discurso de que o mundo é um grande conjunto de seguimentos
interligados (cosmo, físico, químico, cultural, entre outros) e, com isso,
refletindo se as produções culturais e tecnológicas do homem estão tão
desassociadas assim dos aspectos biológicos. Mas, afinal, há alguma ligação
entre o corpo humano e suas produções artísticas?
Não
podemos negar que nossos aparelhos biológicos neurais, perceptivos e
psicológicos, que nos fazem armazenar informações, pensar o mundo e o idealizá-lo,
são alguns dos principais fatores para as produções culturais. De fato. Parece
até meio que obvio dizer isso, mas é fundamental referir-nos a esses fatores
para não cometermos equívocos futuramente.
Penso
que esses aspectos biológicos são fatores importantes para determinarmos nossas
produções culturais – dando ênfase às criações literárias – enquanto produtos
biológicos, ou melhor, produtos de nosso corpo. Mas há mais para fundamentarmos
essa hipótese.
Por
muito tempo, estudiosos vêm reproduzindo – não sei, ao certo, se foi a partir
Freud ou Karl Marx - o discurso de que o homem não nasce homem, mas torna-se.
Eis uma afirmação importante que concordamos. Não podemos negar que ao
nascermos e passarmos da fase pré-edipina somos bombardeados de signos
ideológicos que fundamentam o espaço sociológico do homem. Sim, estamos
condicionados a perceber e significar o mundo de forma simbólica. Isso faz
parte nossa natureza biológica e social, fato inquestionável de nossa essência.
Nesse
contexto, em que a criança, ao nascer, encontra-se condicionada a um emaranhado
de ideologias, cabe a esse individuo percebê-los, escolhê-los e os encarnar
para se fundamentar enquanto individuo social.
Não podemos negar que todo esse processo acontece de forma
idiossincrática, pois nem todos nós somos condicionados aos mesmos signos
ideológicos. Daí percebemos nossas diferenças e semelhanças referentes aos
nossos familiares, amigos, colegas, entre outros.
Mas,
enfim, em quê a produção literária relaciona-se com todo esse processo do
nascimento a constituição do ser homem, levando em conta suas características
enquanto produto de um corpo biológico?
Partindo de uma leitura marxista, podemos
dizer que os signos ideológicos, que foram escolhidos entre muitos outros
símbolos, idealizados e encarnados pelo autor, vão agora participar do conjunto
de signos que podem ser encarnados na obra literária. Talvez seja essa a razão que acarretou
Silviano Santiago dizer, no seu livro Nas
maias das letras: ensaios, que só se pode narrar a experiência de um
jogador de futebol se for ou presenciar um jogador de futebol. Com isso,
poderíamos considerar literatura uma extensão do corpo humano, tendo em vista
sua essência enquanto produto de um aparelho biológico de um corpo humano e
apresentar ideologias que um dia fizeram ou fazem parte do fundamento desse corpo
humano produtor.
Levando
em conta tudo o que foi dito até então, me deixaria ler seu corpo, se algum dia
você criar uma obra literária? O pensamento de quem recepciona perguntas como
essa poderia ser o mais inescrupuloso possível, considerando todo esse nosso
contexto em que a sexualidade é colocada muito em evidencia. Mas não nos contaminemos tanto assim.
By:
George Lima
Interessante artigo.. Parabéns ao criador.
ResponderExcluirBy, Higino Teixeira
Não consegui ver nenhuma relação do texto com o título.
ResponderExcluirNormal! As vezes acontece de não pegarmos o acarretamento semântico do texto numa primeira leitura. O titulo é uma forma lúdica de remeter ao conteúdo. No texto considero Literatura enquanto corpo e no titulo peço para ler um corpo. Partindo do pressuposto de que literatura é equivalente a corpo, poderíamos traduzir o titulo da seguinte forma "Me deixa ler sua obra literária?". Como podes ver, há sim uma interface do texto com o titulo. Espero ter esclarecido. Obrigado pela leitura. Forte abraço.
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluir